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segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Garota Cinza

Garota Cinza



               Lá estava ela. Toda trabalhada em escalas de cinza e preto. Sua camiseta outrora fora estampada com o nome de alguma banda de rock, mas o tempo levara a estampa e deixaram a camisa apenas preta, envelhecida e desgastada, quase cinza. As calças costumavam ser roxas, mas a fuligem do dia-a-dia e o desleixo da garota as deixaram mais preta que a blusa. A mesma fuligem e o mesmo desleixo tornaram o rosto dela também cinza. Exceto a boca e seus olhos.
              Seus olhos eram feitos do azul claro mais belo que eu já havia visto, algo como a cor que as hortênsias têm perante a luz do luar e dos primeiros raios de sol. Seus olhos, vez ou outra postos em cima de mim contrastam belamente com seus lábios azul meia noite, estes sim eu queria sobre mim...
               Ela jogava truco com alguns fora da lei, esses mais imundos que nós dois juntos, enquanto aquela coisinha azul meia noite proferia mais palavrões na ultima rodada que eu em minha vida toda. Pedi uma ultima dose e anunciei:

               - Vou jogar.

              Não era um pedido, não admitia recusa e o máximo que ela pode fazer foi balançar os ombros cinza, e falar algo como:

              - Um ladrão a mais ou a menos não fará diferença.

             A risada dos homens foi gostosa e a minha amarga, mas eram palavras tão vazias quanto meu copo e aquelas duas coisinhas azul hortênsia tinham um brilho mais ardente que o cigarro em sua boca. Puxei a cadeira, as cartas e lá se foi a noite, entre doses de bebida baratas, perdas, ganhos e, horas depois, estavamos todos tão bêbados que já não distinguiam as cartas.
             Fomos embora daquele hospício que chamamos de lar. Sim, fomos, eu e aquelas coisinhas azuis. “Na minha casa ou na sua?” Perguntei, e a resposta foi muda. Despiu-se ali, a luz da lua, despiu-me, e possuiu-me. Sim, foi ela que me possuiu, num ato mudo. O ato de uma garota cinza que conhecia todos os palavrões, mas nenhuma palavra de amor.

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