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segunda-feira, 15 de julho de 2013

O rastro de uma desconhecida



Sentada no meio do jardim, debaixo de uma árvore graciosa, ela, a mulher sem nome, observava tudo com olhos de quem não quer ver nada. Estava farta das pessoas que caminhavam, do barulho dos carros ao redor, do ruído do silêncio de seus pensamentos ecoando na cabeça, cansada do vazio no coração, na mente. Eram poucas as coisas que não a estressavam ou enjoavam. Estava cheia de tudo, até de nada. Pois, afinal, o nada era o que a fizera perder o controle. O não do amor, o sem da presença e o longe do sentimento. Todas as sensações de falta eram o motivo daquela rebeldia aparentemente infundada. E, para resolver esses problemas que persistiram tanto, resolveu recorrer à um contato com a natureza para encontrar mudança. E se a natureza fosse mesmo remédio, estava no lugar certo: podia sentir o coração da terra vibrando ali.

Mas não esperava que nenhum ser, uma fada da natureza a procurasse para resolver seus problemas com mágica. Não. Esperava entender a independência do natural, e se inspirar nisso. Queria encontrar em si mesma a adenda que faltava. Não suportava mais esperar que outras pessoa fizessem aquele trabalho sujo, até porque elas não o faziam. Nunca. Mas, por mais que se ativesse à textura da grama verde, ao som dos pássaros, à velocidade do vento e ao cheiro de maçã, se prolongou para achar respostas. E não as encontrou mesmo assim. Quase esmurrou-se a si mesma. Era tão frustrante viver daquela forma, apostando as chances em coisas que nunca se sucediam. Não era somente sua culpa, ah isso nunca. Um pensamento de que precisava seguir o padrão (homem + vestido branco + criança de olhos claros = felicidade) haviam se tornado estátua de sal em suas virtudes. Aquilo perpassava tudo o que nela estava contido, e tocava fundo na alma: jamais será feliz sem todos esses sonhos fúteis.

Era o que sua mãe sempre dizia: ninguém se casaria com tamanha incapacidade no trabalho doméstico. Retrucava, tentando acreditar que sua mãe mentia, mas acabava por cair na cama, naquele oceano calmo, porém perturbador, para derramar lágrimas de insegurança. Acabava acreditando, e o vento carregava as folhas, a razão e os sorrisos.

A mulher sem nome socou o peito da terra, e esperou que seu sangue parasse de bombear, que seus pomares não dessem frutos, que seus rios secassem. Socou a natureza mais três vezes e saiu. Inútil. Foi quando tomou o único caminho que sua mente esfarelada enxergava, a última opção. Engoliu em seco e saiu do jardim, para ver aqueles tons vibrante pela última vez. Assim, vagarosa e hesitante, seguiu para sua última chance, para o caminho da plenitude: foi para a fábrica.

Naquele lugar cinza e afastado da vida, aprendeu a cozinhar, passar roupas e se dar ao respeito. Aprendeu que homens e mulheres são coisas completamente diferentes, a ser submissa. E ela, juntamente com outras mulheres, finalmente aprendeu que quanto menos se questiona, mais feliz se é. Não houve melhor solução para a mulher desconhecida, casou em pouco tempo, e logo teve um filho de olhos escuros. A felicidade não era maior que a ponta do dedo mindinho, mas ao menos parecia estar lá em algum lugar do íntimo. A mãe sorriu, o pai também, e ela os acompanhou. Cada dia que acordava e via o homem do seu lado, suspirava de prazer, e dava início à rotina gelada.

Mas um dia, um dia de sol, algo o inquietou, e voltou para o jardim.


O ar tinha cheiro de podridão, a grama era cinza, e o troncos das árvores, sépia. Uma lágrima rasgou a face, ao passo que ela percebia lentamente: a natureza havia morrido. Só restavam cinzas, destroços de um tempo em que a infelicidade era falsa.
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