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domingo, 14 de outubro de 2012

Memórias do anjo decadente

Estava ébrio. Assomado pela culpa e desespero.

Um pecado em meio a tantos outros. Uma vida regada aos prazeres mundanos. Um talho negro entre o véu do sagrado e profano. Estava ébrio, como sempre estivera. Subjugado pelos desejos mais carnais, aproximando-se cada vez mais dos humanos em suas tentativas desesperadas de ignorar a dor do mundo que os envolve.

Estava completamente embriagado. Perambulava pelas ruas com maior tranquilidade. Tinha o mundo em mãos, que besteira! Por que haveria de contentar-se com tão pouco?! Sonhava com tudo o que queria, mas não percebera que possuía tudo o que sonhava.

Era cego, não notava a vida em tons de cinza, como os humanos pessimistas. Enxergava os vários matizes, saturações variadas e tonalidades mil. Era como um artista, apreciando a beleza de sua obra-prima após a última pincelada.

E por um momento era feliz, quando o álcool percorria seu sangue.

Embriagava-se em meio ao próprio desejo, a própria felicidade. Em sua mente, vivia a vida que desejava. Por um breve instante podia voar. E o fazia! Mas então o que era aquele vazio no peito juntamente com o vazio do copo? O que falta a alguém que tem tudo que se possa ter? Não compreendia. Mas recordava-se.

Então se via vagando pelas ruas. Refletindo o máximo que podia: o máximo para um anjo embriagado. Na mochila, suas asas, surradas, colocadas de qualquer forma, enegrecidas pelo passar dos anos, sujas pela mácula em sua alma. Foi em meio àquela peregrinação que a encontrou. Era como um raio de sol que maculava e penetrava a escuridão. A luz que o apartaria das trevas. Uma consolação em meio ao abismo que ele estava.

Ela viera numa noite fria de 1987. Em meio às ruas de Londres, nevava. É claro, o anjo se encantara! Por mais que não entendesse os homens, aprendera a contemplar sua beleza. A poesia que emanava de cada corpo. Mas ela não o pertencia. Quão desolador, pobre anjo!

Como tamanha perfeição não poderia ser sua? Não era compreensível, ou ainda, aceitável. Ensandecido pelo próprio ego, o anjo tornou-se ébrio. Vagando pela Terra, em busca do seu Sol. Em busca dela, como sempre fora destinado a acontecer.

Decadente anjo! Condenado a viver como os homens. Morto, aos poucos pela paixão sublime que o acometera... Triste anjo!

E agora perambulava pelos bares, entornando copos e mais copos de álcool, escrevendo suas memórias, seus textos em um velho bloco de papeis, amarelado com o passar do tempo. Decadência!

Decadência do Anjo.

Sobre o Autor:
Gilson Santiago Gilson tem 15 anos, ama escrever prosa e narrativas. Tem um gosto por ser clichê e ser irônico boa parte do tempo. Escreve por um mundo melhor, ao menos, em sua mente.
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