Dance pequena, na
ponta dos pés. Dance sobre o mundo que desmoronou ao seu deleite. Dance, porque
dançando você é completa - na ponta dos pés é quase minha. Dance minha pequena
criação.
Dance sobre a
morte que lhe habita. Dance para escurecer ainda mais o breu do seu olhar de
menina malvada. Dance com suas facas grudadas em minha pele. Dance em minha pele.
Dance filha
minha.
Baile assim do
seu jeito, com seu corpo moldando-se ao meu, fazendo de mim sua ideal morada
antes do amanhecer. Encontre-me de braços abertos a esperá-la em um beco escuro
enquanto ainda não é dia. E junto adiemos os dias! Dance comigo por todas as
noites da nossa vida (des)vivida, embala-me, usa-me.
Despedace-me. E morra por esse
bailar que a mantém viva.
Curve os lábios
me um fio de voz frouxo e rouco: não mais que uma confissão. “Amo”. Ama
o que menina? Ama a quem? Ama seu pai, amante e amigo? Ou ama aquele que a
ensinou a matar? Mate em meu nome três vezes se preciso for! Suje as calçadas
com sangue tão imundo quanto o nosso!
Mas permaneça
viva para que na noite seguinte eu possa contemplar o seu bailar.
Quando romper o
dia separe seus brotados seios desnudos de minhas costas e desenlace-nos. Faça
da normalidade o fato anormal, você longe de mim, daquele que a fez menina e
mulher. Aquele que fez da sua dança nosso acoite, crueldade mórbida nas noites quentes.
E quente também
é o seu sangue, afinal não é ele também o meu? Esquente-me com seus pés a roçar
o sexo meu enquanto ri com seus olhos de ressaca marítima. Oh! No mar dos seus
olhos eu mergulho e juro que se soubesse morrer morreria por eles! Morreria
neles! Afogado e enganado pela menininha que espicha pelas meias quatro oitavos
– minha menina dançante.
Dance para mim
bailarina da morte.
Faça das poças de sangue seu ideal tablado.
Dance em carmesim! Em vermelho vinho que bebo do corpo seu. Faça-me ébrio do néctar
do seu corpo – do sexo que é somente meu. Dance e viva, pequena. Viva porque a
morte é sua fiel amiga, afinal são pelos passos dela que você segue o seu
bailar; seu bailado tem aroma de término.
Dance para o seu pai filha.
E grite e corra para meus braços. Injete-se em minhas veias saltada como a
heroína da minha vida, mas também seja meu torniquete, enquanto a mim cabe ser
a sua salvação. Mas nunca a salvarei de mim, porque eu também sou você. Somos
almas unas no mesmo desespero de não saberem morrer, mas que vivem pelas doses
homeopáticas de suicídio. Transforma-me em música e deixe que eu seja sua
escala dissonante. Morra por mim mais três vezes, mesmo que eu não morra nenhuma
por você.
Em meu nome torne-se Jesus, enquanto para
você serei somente Judas. Talvez você possa ser Madalena: mas falta santidade
em você? Então seja somente minha Maria, minha Virgem Desvirginada, de pés
descalços e sorriso jocoso, aquele que se deleita com a dor de um tapa em carne
já trêmula. Seu sorriso mais bonito! O que faz-me o ser mais extasiado do
Universo é esse seu sorrir que pede por mais dor, por mais chagas em pele já
dolorida. Peça mais, querida. Peça minha bailarina, faça dos seus gritos sua
música: torne-me seu maestro!
Dance em nome do Espírito Santo, mas nunca
proclame o amém. Baile sobre seu próprio corpo morto – no fim é isso que
restará. Você morta e eu a desvirginar-te três vezes mais e mais.
Mas não dance mais, pequena: dê início à contradança.
Nascido no inverno de 92, cursa Letras, mas pretende cursar em breve História da Arte. Ama metal como ama artes plásticas, cinema, preto&branco, livros manifestações culturais populares e musicas regionais. Escuta um pouco de tudo - assim como escreve. Só não sabe se descrever. |