‘’Num dia eles pegaram uma abóbora verde e cortaram olhos e
boca nela.
A gente morava numa fazenda porque antigamente era assim.
Você morava numa roça e o próximo vizinho ficava meio longe de você, não sabia
o que acontecia na sua casa e nem você sabia o que acontecia na dele. Naquele
tempo, quando era criança ainda, eu era mijona. Eu mijava na cama todo santo
dia. Eu tinha uma madrasta daquelas de verdade. E ela tinha uma irmã cúmplice
de suas maldades. Minha mãe me abandonou sei lá porquê, e então eu vivia com
meu pai e essa madrasta aí. Meu pai trabalhava o dia todo, e eu ficava em casa
com ela. Naquela época, não tinha disque denúncia, não tinha vizinho ou pessoa
alguma que se preocupasse com o que acontecia na sua casa. E se você saísse da
linha, os castigos eram duros. E então toda noite eu ouvia ela dizer:
- O urinol! Já pegou o urinol? – Esse é o nome que a gente dava pra pinico. Os banheiros antigamente ficavam do lado de fora da casa, por isso a pergunta todo dia. Era apenas um pinico, e eu tinha que lavar ele e colocar ele pra dentro de casa quando ficasse escuro, e colocar ele debaixo da cama.
- O urinol! Já pegou o urinol? – Esse é o nome que a gente dava pra pinico. Os banheiros antigamente ficavam do lado de fora da casa, por isso a pergunta todo dia. Era apenas um pinico, e eu tinha que lavar ele e colocar ele pra dentro de casa quando ficasse escuro, e colocar ele debaixo da cama.
- Já, já peguei! – Pra mim ele tava debaixo da minha cama,
como eu tinha deixado.
- Não pegou não, tá lá fora, vai lá! – E lá ia eu pateta,
criança ainda, pro frio e o escuro do mato. Me fizeram ir lá pro meio do mato.
E lá fui eu procurar o urinol, ouvindo barulho de grilo, de rã, de sei lá mais
que bichos. Quando eu tava longe de casa, eles apagaram a luz, e eu só vi algo
coberto com um pano branco fazendo ‘’uuuuuuuu’’ e o urinol lá no chão, com uma
cabeça assustadora olhando pra mim. Era a abóbora. E eu lá me tremendo de medo,
gritando, chorando, e já não sabia se tava mijada ou se tava cagada. E eu tinha
que pegar o urinol, porque se não voltasse com ele apanhava.
É, minha neta, judiavam de mim. Agora você vê, acredita que
a desculpa deles é que faziam isso pra tentar fazer eu parar de mijar na cama?
Onde já se viu dar um susto numa criança antes de dormir, aí é que eu mijava
mais ainda mesmo, eu dormia e sonhava que tava mijando de tão nervosa que tava.
Quem tava coberto se fazendo de fantasma era a irmã da minha madrasta. Essa,
quando voltei pra casa, ainda me bateu bastante por ter voltado apavorada e
mijada. Pelo menos eu peguei o urinou. Tá vendo, é por isso que eu tenho esses
problemas no coração que nem médico entende. É de tanto susto que levei na
infância.’’
Das histórias de
domingo na casa da vovó.