Brincava com o mundo nas
mãos, iludindo o pensamento que poderia controlá-lo ao seu modo.
Dominava o globo à sua maneira, sua mente invertia polos, juntava continentes, retomando o mundo a Pangeia, para dominá-lo como verdadeiro megalomaníaco que sempre quis ser. Uma mentira de criança nas mãos dum adulto, nostalgias da infância bem vivida.
Com o mundo entre os dedos, sentia-se mais do que realizado. Ria com orgulho do seu feito, enquanto o filho mais moço devorava com inexatidão um livrinho infanto-juvenil qualquer. Um best-seler sem conteúdo, vazio demais para a prole de um sonhador com o mundo em seu enlace.
Mas o conteúdo do livro poderia ser qualquer um, bastava que o menino estivesse ao alcance do seu olhar, trazendo a sua mente insensata recordações da infância entre as plantações, carregando uma coleção de livros antigos. De “Reinações de Narizinho” à "Morangos Mofados", nada fugia ao seu olhar devorador.
Talvez, isso viria do fato de um dia querer conquistar o inatingível. Seu império deveria ter um começo. Se conseguisse dominar o conhecimento daquelas páginas envelhecidas, certamente dominaria o mundo e todas as suas nunces! Acreditava nisso fielmente; assim continuava lendo, enquanto o sol castigava-lhe a mente infantil.
Os dedos sujos de terra úmida abriam os livros com rapidez, acreditando que decorando aquelas páginas teria o mundo aos seus pés. Em sua biblioteca iluminada pelo sol, o homem lembrava do utópico sonho, que veladamente ainda almejava realizar (ou talvez não, nessas horas, não sabe-se de muitas coisas), só para sentir ainda mais o ocre do saudosismo entre lábios tão maculados.
Jurava que sentia a
umidade da terra em suas unhas. Acompanhada com aroma dos livros mofados e mato
crescente, tão nostálgico que o fazia fechar os olhos com força, esquecendo do
mundo que controlava num toque sutil. Entre a nostalgia e o resto do
mundo, preferiu sorrir para suas
ilusórias (mas tão reais) recordações, como um bom pai que vive a sorrir para
seus filhos.
Assim, sorriu como há muito não permitia-se, nadando confuso na própria mente, mentindo que um dia teve sim o mundo em seus domínios! Oh!, como saberia ser ilusório e iludido o pretendente a dono-do-mundo! Um homem sério que renovou nos olhos o brilho do seu mundo – que só resumia-se a livros mofados e palavras rebuscadas.
Assim, sorriu como há muito não permitia-se, nadando confuso na própria mente, mentindo que um dia teve sim o mundo em seus domínios! Oh!, como saberia ser ilusório e iludido o pretendente a dono-do-mundo! Um homem sério que renovou nos olhos o brilho do seu mundo – que só resumia-se a livros mofados e palavras rebuscadas.
Naquele tempo a saudade
não existia, pois sabia viver somente o ato em seu tempo normal. Correr pelo
gramado, pisar nas formigas-de-fogo, colher a horta, ser criança e ler avidamente,
era só isso que cabia em suas ações, nada mais do que simplesmente viver de
modo infantil e sonhador, como seu filho agora fazia (mesmo que de um modo
diferente).
Com os olhos pregados no livro que lia, o filho seguia os passos do pai, pronto para crescer iludido entre seus reprimidos desejos infantis! Fantasiando que aqueles seres mitológicos e distorcidos existiam na realidade dos seus pés correndo pela casa fincada no meio dum asfalto quente e impessoal. Não havia nada de bucólico naquela cidade grande, talvez só as recordações infantis assolando a mente crescida de um ex-menino.
Gostava de pensar que poderia ser um eterno “ex”. De ex-dono do mundo até ex-sonhador, mas nunca (nem eu seus mais utópicos devaneios) cogitou ser um ex-menino. O som agradava-o tanto! Talvez seja um eufemismo descarado para não sentir o peso do tempo enrugando-lhe a pele que outrora fora esticada e lisa. Na verdade, ele não chegava a ser idoso, mesmo tendo passado a linha dos trinta e três, não sabia se queria envelhecer mais.
Com os olhos pregados no livro que lia, o filho seguia os passos do pai, pronto para crescer iludido entre seus reprimidos desejos infantis! Fantasiando que aqueles seres mitológicos e distorcidos existiam na realidade dos seus pés correndo pela casa fincada no meio dum asfalto quente e impessoal. Não havia nada de bucólico naquela cidade grande, talvez só as recordações infantis assolando a mente crescida de um ex-menino.
Gostava de pensar que poderia ser um eterno “ex”. De ex-dono do mundo até ex-sonhador, mas nunca (nem eu seus mais utópicos devaneios) cogitou ser um ex-menino. O som agradava-o tanto! Talvez seja um eufemismo descarado para não sentir o peso do tempo enrugando-lhe a pele que outrora fora esticada e lisa. Na verdade, ele não chegava a ser idoso, mesmo tendo passado a linha dos trinta e três, não sabia se queria envelhecer mais.
Em seu tempo de criança
nunca imaginou-se velho. Seu pensamento levava-o somente aos vinte e dois anos,
copos de whisky nunca outrora provados e a dominação mundial. Dentro de
suas páginas amareladas tornou-se um verdadeiro Napoleão, só faltava-lhe os
belos quadros e as realizações históricas.
Os outros moleques
desordeiros riam do seu devaneio utópico. “O mundo é grande demais para você,
Daniel”, comentavam enquanto esvaziavam pneus dos carros visitantes distantes
que até ali chegavam. Quando ouvia essa ele deixava-se abater, afinal, o
planeta era realmente uma imensa esfera e ele ainda um menino devorador de
livros. “Mas se eu não puder ter o mundo, o que terei?” O pensamento divagava
nessas horas e nunca chegava a uma conclusão.
Com fios perdidos de
pensamento, Daniel cresceu. Da infância trouxe sonhos perdidos e palavras
encontradas, a terra entre os dedos e a vontade de sentir o whisky
descendo-lhe pela garganta. Fez dezessete e furtivamente do whisky
provou. Gostou do sabor e da queimação. Como quem realizava um sonho tomou
várias doses depois dessa e a dominação mundial virou somente uma alienação
infantil.
O filho acabou a leitura e
saiu da biblioteca, fazendo sua mente parar. Viu os próprios passos refletidos
no filho, um andar apresado, mas ainda assim calmo. Sozinho em sua habitual
estranheza o homem permitiu-se gargalhar alto, achando tão incomum que só agora
tivesse reparado que o próprio filho era um espelho seu! Um verdadeiro filho de
alguém que um dia quis dominar o indominável.
Como quem não quer mais o
mundo deixou o globo cair no chão e quebrar-se em mil e um pedaços. Ganhando
uma beleza até então desconhecida pelos olhos semi-cansados de um devaneador
bucólico composto em vários tons de nostalgia.
Agora ele não precisava
mais brincar com o globo nas mãos para iludir o pensamento. Tinha um Universo
inteiro que já poderia chamar de seu.
(um universo de passos apressados, livros infanto-juvenis e
queimação)