Home

domingo, 28 de outubro de 2012

Inconsistência




Sentada sobre uma antiga cadeira de balanço que pertencia à sua vó, a garota acariciou a barriga. Tinha treze anos e ar de cansada da vida, a criança em seu útero acabava de completar sete meses – uma menina.

Suspirou. As lágrimas começaram a cair involuntariamente. Era isso, em dois meses sua filhinha iria nascer e essa agora seria a sua nova história. Ser mãe... Ela nunca pensou nisso seriamente. Balançou a cadeira.

Se alguém a olhasse de frente, perceberia que seus olhos castanhos já não brilhavam como antes – naturalmente, ela já não tinha em posse a própria vida –, mas se esse mesmo alguém soubesse que ainda existia uma razão, apenas uma, que fazia seus olhos brilharem de vez em quando. Bem, ele saberia que aquela garota ainda não estava completamente perdida.


Porque eles brilhavam no palco.


Plié, elevé e grand getê, cada passinho que dava com as sapatilhas nos pés era motivo de felicidade. Ela tinha presença, a menina. Sonhava em voltar a dançar, em voltar a brilhar (porque certas pessoas nascem para isso, para brilhar), mas era apenas isso: sonhos. Inconsistentes sonhos.

E juro, a garota tentaria, mas nunca conseguiria amar sua filha. Aliás, ela nunca foi realmente capaz de amar ninguém. Amou por toda a vida apenas o seu palco. Seu único amigo. O único que a amou. E por isso, julgo, não acho que ela saiba o significado verdadeiro da palavra amor. Ora, ela nunca foi amada, não é? Apenas... traída.

A cadeira foi balançada pela segunda vez. O choro silencioso ainda não havia cessado. A mão acariciou a barriga de novo. Os olhos da garota se fecharam.



Comentários
1 Comentários

Um comentário:

M. Deméter disse...

Lisa, que lindo. *-*
E totalmente triste, mas poxa, é ballet. Gostei. (: