Home

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Tempo?


O seu nome era André. E esse era um cara bastante introvertido, cheio de vídeo games na cabeça, e altamente viciado em cafeína. Queria um dia ser programador de computadores, mas nunca tinha coragem de levantar da poltrona verde da sala de estar para procurar um emprego. Tomava sorvete 24 horas por dia, e parecia fazer teima para não engordar, pois mesmo com todas as calorias ingeridas, continuava seco, como um bambu, sentado eternamente na poltrona verde, com um controle preto na mão, olhando para aquela televisão de 45 polegadas. E era final de ano, então. E ele continuava lá.



Sentado na poltrona verde, com o controle na mão. E a grande televisão de 45 polegadas. Mas André era como qualquer pessoa e queria um emprego no próximo ano, uma televisão maior, um videogame melhor, e a poltrona azul que tinha visto na internet. Sustentado pelos pais, não tinha dinheiro, evidentemente para tal, mas ainda sim queria. Ele nunca iria sair da poltrona, nunca iria largar o controle, mas esperava a mudança.
— Feliz 2013. — Disse o amigo na internet.
— É, você também. — Respondeu sem o mínimo de emoção nas palavras.
— Vai mudar?
— Quem é que não vai? Todo mundo vai mudar ano que vem. É um ano melhor. Sempre é... Eu acho.
E tudo mudou? Sim, tudo mudou, é claro. André ganhou na loteria. Foi um sortudo, sim. Sempre fazia seu joguinho; era como o evento do ano, o dia em que saía da poltrona verde e fazia algo. Trabalho não era a sua procura.
Mas isso não importava. Tudo mudou.
E havia aquela, a senhora Lena, a mulher trabalhadora, de dois filhos com seus 8 e 10 anos. Solteira, uma mulher com visão. Visão não somente pelo olhar de fogo que tinha, mas pelas ideias que sempre permaneciam fiéis aos seus valores. Bastante feminista, desde que pusera o primeiro pé no mundo, já era certa disso. E não se arrependia. Talvez fosse a novela das sete na verdade, não o seu gene idealista, como dizia seu marido, mas ela não queria pensar assim. Gostava muito de novela, é bastante verdade. Quase com a mesma intensidade de que gostava de leite.
Mas ela também não fazia muito para mudar. Ou pelo menos para mudar a sua vida pessoal. Sempre altruísta, humilde, nunca olhava para si própria, e acabava que seus sonhos de consumo eram sempre deixados de lado para atender ao todo, à massa. Queria uma poltrona nova para a sala, uma televisão mais moderna, e um videogame novo para o filho mais velho. Ela tinha seu emprego, mas nunca deixava um tempinho, ou melhor, um dinheirinho para usar para tais fins. Não era preguiçosa, ao contrário de André, mas sim visionária demais. Esse era o seu problema. (Vamos descartar o fato de que estava começando a se viciar demais em laticínios.)
Disse que tudo iria mudar para a amiga no salão.
E tudo mudou? Não.
Claro que nada ia mudar. Ela queria ganhar na loteria, mas nunca jogava.
E é só então que chego no ponto chave de tudo o que eu queria escrever. A droga dessa data comemorativa que fazem todos buscarem um motivo para mudar. Não precisamos de motivos. Somente de objetivos. De sonhos, de atitude. Esses são os ingredientes para que alguma coisa se faça sensivelmente diferente. Não me apego nem ao fato de as pessoas parecerem impotentes, mesmo com todas as chances jogadas à sua frente, mas sim ao significado dessas datas, que as pessoas tanto se agarram, como se por mágica, algo acontecesse. Algo de grandioso.
O que na verdade é uma virada de ano? Um segundo no qual iniciamos mais uma jornada. Não.
Não é uma jornada, é somente mais um ano! Igualmente o 2012 foi, será o 2013. Pelo menos será se você continuar apenas desejando, sem mover um dedo. Não digo que desejar seja de todo ruim. Mas como eu disse, não quero me apegar àquela velha preguiça, que faz todo mundo se sentar numa poltrona verde e assistir televisão para sempre.
Tudo tem que vir de você, mas não no último segundo do ano que se despede, mas sim desde o início deles. Sabemos como tudo parece demorar à acontecer. Um objetivo leva tempo para ser atingido, e um dia, uma hora, um segundo, não é o suficiente. Você faz o próximo ano, não o próximo ano te faz.
E, talvez mais importante ainda: quem foi o infeliz que ditou que somente em aniversários se presenteia, se faz festas? Gosto de aniversários, mas odeio mensagens que desejam que seu DIA seja ótimo. Então somente o dia do seu aniversário deve ser bom? O resto tem que ser um poço de trevas. Ou pelo menos a pessoa que desejou um feliz aniversário não se importa com o resto do ano.
Margô, uma senhora que fazia torta de limão divinamente, e que tinha acabo de ganhar seu primeiro telefone celular, se espantou, ou talvez se enraiveceu no dia em que completou seus 57 anos. Uma mensagem chegou ao seu celular, e este emitiu um bip.
— Diego! Venha cá! Que droga eu fiz para esta pessoa que eu mal sei quem é, que me manda um feliz aniversário e um ótimo dia?
— Oh, vó. Como mal conhece? Você mesma possui o contato no telefone. A senhora quem o adicionou à sua agenda telefônica.
— Sim, eu o fiz. Mas não fui com a cara do sujeito. Essa tal de Marcos. É amigo da tua mãe, um jovem bastante irônico.
— A mamãe deve ter comentado sobre o seu aniversáario. Ele não quis ser grosseiro e enviou essa mensagem. É bastante barato enviar um torpedo hoje em dia.
E a velha ficou reclamando sobre isso durante um tempo. Embora rabugenta, a senhor Margô estava certa. Se ao menos dessem o devido valor à data... Mas não, simplesmente enviavam torpedos irrelevantes. Quem disse que ela não merecia uma mensagem durante todo o tempo? Ela que tanto tinha feito durante a vida? Aquele era só um dia qualquer, em que completava mas um ano, mais um passo para a cova, como ela gostava de pensar.
O ser humano é mesmo um bicho terrível. Tenta se apegar à ideias fantasiosas, mesmo quando julga de pé firme a inexistência de fantasia alguma. Parece mais um consolo para a alma, que necessita de um apoio, de uma ideia de que algo acontecerá por mágica, naquele dia especial. As pessoas procuram em outras coisas, outros seres, o que podem encontrar em seu próprio âmago, naquele pedacinho escondido, privado, da alma. As datas são como vento, que passa rápido, e mal deixa o seu rastro. Coisas grandiosas acontecem com anos, décadas, séculos. Ninguém nunca viu um aluno conseguir boas ou más notas somente por um único dia do semestre. Ou um presidente conseguir o cargo com somente uma hora de campanha.
Não adianta esperar ganhar na loteria para comprar a poltrona nova, ou a televisão maior. Atitudes precisam ser imediatas. O instante atual é o instante crucial.
Nem é difícil de memorizar.
Sobre o Autor:
João Victor Ferraz Não que alguém se importe, mas João é um sonhador, no começo de seus 15 anos, que só pensa em fazer Jornalismo e ter livros em todas as estantes do mundo. Isso mesmo, do MUNDO.



Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário: