Para comemorar o famoso (não tanto aqui no Brasil, infelizmente) Dia das Bruxas, a Decadência (mais especificamente eu - João Victor -, Erica e Lucas) decidimos fazer um "especial", para comemorar a data. Afinal, o que mais poderia fazer A Decadência pelo seus leitores no Halloween, se não alertar sobre os perigos da data? Hahaha Divirtam-se!
A hora mais odiada e mais necessária do dia havia chegado
tão rapidamente que quando viu que já era tempo de descer do seu pequeno e
precário apartamento para ir para o trabalho, assustou-se. Vestiu o vestido
vermelho com aberturas nas costas e um decote grande na região dos seios, que
deixava suas pernas bem à mostra e apertava bastante nos quadris, aumentando
ainda mais o volume que tinha. Era naquele momento que dava adeus à sua real
identidade e passava a se chamar Suzy, uma das mais famosas prostitutas da
Avenida Madalena. Vamos dar, por que viver está complicado,
pensou, rindo da piada sem-graça e cruel que tinha de aturar todos os dias
desde que completara os seus 10 anos de idade.
Penteou os cabelos negros e lisos e passou um batom de uma
cor aproximada à do vestido, e saiu com seu salto alto, para uma caminhada de
vinte minutos até lá. A noite já caía, e o céu estava com uma tonalidade roxa,
com pequenos pontinhos luminosos e uma lua cheia e azulada pendendo no céu. A
noite era tranquila e fria, e o único som que escutou era o de carros passando
ao longe, na Avenida para onde seguia naquele exato momento. A brisa parecia
trazer consigo um mar de maus presságios, e toda vez que dava um passo, um
calafrio congelava o seu corpo e eriçava a camada fina de pelos em seus braços.
Não se sentia assim indo para o ponto desde que começara a vida como
prostituta, e a sensação lhe trazia à mente momentos cruéis, brutais e
dolorosos que sofrera naquela época. Tentou afastar aquilo, e seguiu o resto do
caminho fazendo de tudo para se focar em coisas positivas.
A Avenida estava movimentada, como sempre, e as outras
quengas estavam espalhadas por toda a sua extensão, numa distância razoável de
uma para a outra, embora algumas delas preferissem fazer pequenos grupos e
revezarem. Elas costumavam se dividir por preço. No começo da rua, as mais
baratas, até chegar ao seu fim, onde Suzy se encontrava. Seu trabalho era bom,
e como todos os clientes gostavam de dizer, valia muito a pena o preço pago. A
situação em sua vida pessoal era complicada, e usar desse pretexto de fazer o
serviço direito uma forma de ganhar mais foi interessante para ela. Os homens e
até mesmo algumas mulheres preferiam à ela na maioria dos casos. Talvez
achassem que o seu aspecto mais limpo se comparado às outras valesse a pena o
preço alto. Ela não sabia ao certo, mas dificilmente o seu espaço estava vazio,
sem nenhum carro estacionado com um cliente louco por sexo fácil.
Logo que chegou, esperou poucos minutos até que um veículo
amarelo parasse em sua frente com o vidro aberto, perguntando quanto era o
programa. Em pouco tempo estava dentro do seu carro, do seu quarto, sobre a sua
cama, com ele dentro de si, e mesmo que os calafrios persistissem, ela fez tudo
como mandava o figurino, e assim passou a noite, entre programas e mais programas
e notas de dinheiro. E só ás duas da manhã pareceu ter um folga para se sentar
no meio fio e descansar um pouco. Tragou um cigarro e ficou olhando as poucas
nuvens caminharem pelo céu, desaparecendo por detrás dos prédios.
Um carro parou na sua frente, e ela, distraída, só prestou
atenção quando a buzina atacou seus ouvidos. Levantou-se apressada e jogou o
cigarro no chão, ajeitando o vestido. Encostou na janela que se abria devagar.
Lá dentro, duas figuras estranhas estavam sentadas. Um tinha uma máscara de
lobo, enquanto o outro usava um gato para esconder as verdadeiras feições.
Estava tão acostumada com todo o tipo de louco por aquelas bandas, que só fez o
mesmo de sempre.
― Os gostosões querem uma noitada gostosa, é? ― E
mordeu os lábios vermelhos. Eles, por sua vez, continuaram observando-a sem
alguma expressão. Despois de alguns segundos, quando Suzy arqueou as
sobrancelhas, o com cara de gato sacou do bolso duas notas de cem reais e uma
de cinquenta, entregado em suas mãos. Era mais do que ela cobrava, mas aceitou
de bom grado. Sem esperar algum convite, entrou no banco traseiro e
acomodou-se. O carro acelerou-se, e durante todo o caminho as duas figuras
permaneceram quietas.
Ela não pode evitar, e esteve receosa durante todo o tempo,
mas não fez nada além de permanecer sentada e observar atentamente o caminho
que seguiam. Com o passar do tempo, ela foi percebendo que as máscaras cobriam
toda a parte acima do pescoço deles e que eram bastante benfeitas, trazendo um
ar bem realista a fantasia deles.
O carro estacionou num local mal iluminado e deserto, em
frente a uma casa com uma aparência de abandonada. Eles saltaram do carro e
Suzy os imitou, consertando o vestido que insistia em descobrir mais e mais
suas pernas. Não que se importasse, mas com aquele frio que fazia, qualquer
lugar que se pudesse cobrir era lucro. Ficou esperando enquanto os dois se
entreolhavam. O com cara de lobo enfiou a mão no bolso e a segurou pelo braço,
levando-a até um muro ao lado da porta da casa. Ela sorria, maliciosa, esperando
por algum sexo selvagem, e usou a mão livre para acariciar o volume entra as
penas do homem, porém este afastou a sua mão. Jogou-a contra a parede com uma
força desnecessária e tapou a sua boca com a mão. Suzy permaneceu parada,
esperando pela ação do homem-lobo, sem demonstrar pânico. Aquele trabalho
requeria calma. Eles eram mais um daqueles loucos sadomasoquistas, somente
isso.
Mas o que ela não esperava, era ver que na mão que ele tirava
cuidadosamente do bolso, estava um agulha grande e fina, com um líquido de
aparência espessa dentro. Arregalou os olhos, e seu grito foi abafado pela mão
que apertava os seus lábios. Tentou afastar a agulha que se aproximava com as
mãos, mas ele logo a controlou. Em poucos segundos, ele injetava aquele líquido
em suas veias, e ela caía num sono profundo.
- - - -
Acordou, e estava sentada numa cadeira dura e fria de
madeira, com as mãos amarradas ás costas e as pernas presas aos pés da cadeira.
Levantou a cabeça, e percebeu que estava sozinha num cômodo escuro, iluminado
apenas pela luz fantasmagórica da lua. Gritou, mas se estivesse dentro da casa
na qual havia parado junto com os dois homens estranhos, seria inútil. Não
parecia que haviam vizinhos. Seu rosto parecia inchado, e as bochechas doíam,
como se tivesse levado um soco no local. A boca tinha cortes profundos que
dificultava o chamado de socorro, e os pulsos doíam. Parecia que o sangue não
circulava por suas mãos haviam horas, e sentia a ponta dos dedos começando a
adormecer.
― Alguém? Tem alguém aí? ― Disse, olhando para os lados,
procurando pelo menos uma sombra dos homens com cara de animal que havia a
levado até ali, mas nada parecia se mover, e ela tinha tudo para ser o único
ser presente ali. O desespero só fez aumentar com o passar do tempo, e seu coração
parecia estar se debatendo violentamente em seu peito, numa busca para fugir
dali. Tentou de todas as maneiras se levantar, mas o fato de seus pés estarem
presos nas pernas da cadeira dificultava o processo.
Até que, do além, uma voz aguda e estranha veio, aumentando
a cada segundo, até tomar todo o espaço num barulho ensurdecedor. As janelas vibravam
com a música estrangeira suave, desconhecida para Suzy. Ela não sabia como, mas
podia jurar que era uma canção de ninar. As notas calmas, e a melodia devagar...
Olhou para trás, procurando a origem do som, mas a única
coisa que viu foi uma sombra passando rápida por uma das janelas e a fez pular
de susto.
― Quem é? Quem é? ― Começou um choro agonizante e tentou
mais uma vez soltar as mãos, mas o seu desespero de nada adiantava. Ninguém a
respondia, e começou a duvidar se alguém realmente a escutava. Poderia ser uma
ilusão da sua cabeça? Podia estar sonhando? Será que aquele lugar sombrio e
aquela música doentia não era na verdade um estado de torpor da sua mente? Um
efeito da droga que o homem com cara de lobo havia injetado no seu braço
direito, talvez. Mas a dor, o som, tudo era tão tocável, doloroso que não podia
ser coisa da sua cabeça. O suor logo começou a escorrer por sua testa, e em
pouco tempo seus seios, quadril, braços e pernas estavam encharcados pela
camada pegajosa de suor.
Abaixou a cabeça, e ficou naquela posição, chorando por um
tempo que não sabia dizer. Só foi chamada a atenção quando um corpo se projetou
na sua frente, olhando-a furtivamente, com aquela máscara perfeita de gato que
parecia tão real. Sua mão se aproximava do seu rosto e ela tentou se afastar,
mas o assento da cadeira tornava impossível. Ele tocou suas bochechas
fortemente, e logo prendia seu rosto com força. Tentou gritar, mas ele era
forte demais. Na outra mão ele trazia um faca afiada que brilhava sob a luz
azul da lua.
― NÃO! POR FAVOR... ― Mas foi inútil, logo a lâmina estava
se aproximando das suas pernas, e entrava pela carne das suas coxas, fazendo
seu corpo de contrair de dor. Não se lembrava de sentir algo tão horrível como
aquilo antes. Não conseguiu parar de gritar, e no meio de lágrimas e suor
escorrendo, sentiu que ele retirava a faca de sua perna, e observava sem
expressão o sangue que escorria e pingava no chão. Não demorou muito e logo ele
estava delineando o seu rosto com a ponta afiada da lâmina. Ofegou, e por um
momento a dor na perna não era mais nada, pois um corte profundo nascia
lentamente em suas têmporas e fazia um líquido grosso e rubro escorrer.
Gritou e gritou, mas enquanto o homem fazia o caminho em seu
rosto nada o fez parar. Ela sabia qual seria o seu destino, e tentou de todas
as formas acelerar a sua morte, mas ele gostava do seu sofrimento. Alguns
minutos se passaram e ela já não tinha mais um dos polegares, e um corte
sangrava na lateral do seu pescoço. Estava tonta, praticamente não sentia mais
nada, e um bolo estranho se formava em seu estômago. Vomitou, e junto com o
vômito, veio também sangue, dor e sofrimento. Não entendia nada daquilo e
preferia não entender. Sua cabeça estava um tanto conturbada para raciocinar.
Já sentia que as forças estavam lhe escapando quando escutou
pela primeira vez aquela noite a voz do homem estranho.
― Agora é a hora da princesinha dormir...
E a faca perfurou seu estômago. Antes do amanhecer Suzy já
se encontrava morta, e junto com ela, mais outras sete prostitutas que haviam
experimentado o mesmo fim trágico.
Não que alguém se importe, mas João é um sonhador, no fim dos seus 14 anos, que sonha em fazer Jornalismo e ter livros em todas as estantes do mundo. Isso mesmo, do MUNDO. |